A palavra aventura tem origem do latim Adventura que significa “por vir”, “por acontecer”.
Muitas pessoas confundem atividade de aventura com atividade radical, mas estaríamos fritos se além de nos aventurarmos incluíssemos o radicalismo nas provas. Isso porque no esporte de aventura corremos riscos, mas conseguimos controlar de certa forma, por exemplo, uma longa descida de bike, iremos devagar tomando todo cuidado enquanto a modalidade downhill de bike é radical pois os caras descem a todo vapor e cada detalhe é crucial para o tempo final que é definido em milésimos de segundo. Ou um rapel onde temos segurança e controle dos riscos envolvidos, muito diferente de uma mega rampa de skate ou algo assim. Claro, somos ameaçados o tempo todo pelo risco de uma queda feia, mas iremos evitar essa situação e não enfrentá-la com super manobras.
Hoje, não só escolhemos ser aventureiros, como escolhemos nossas aventuras. Treinamos e nos preparamos para ela e então nos aventuramos e podemos medir o quanto nossa preparação foi eficiente para aquilo.
A vontade de explorar, conhecer o desconhecido e muitas vezes a necessidade de fazer isso para sobreviver, já vem de nossos ancestrais e hoje deixamos o conforto da vida contemporânea para nos aventurarmos, a aventura moderna é também uma exploração, mas uma exploração interna.
Competir numa corrida de aventura é como comprimir a experiência de anos de vida num curto período de tempo. Você aprende muito sobre si mesmo e sobre seus companheiros, especialmente suas forças e fraquezas, descobre qualidades em você. Aprende a lidar com pessoas em diferentes circunstâncias, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença! Seus parceiros podem estar rindo ou chorando e você se verá como mentor, pai, filho, aprendiz, capitão, consultor, em fim, tudo para tentar manter o time seguindo em frente em busca de um objetivo comum, a linha de chegada.
A corrida de aventura exige de um atleta habilidades que encontramos em muitos outros esportes, força, coragem, inteligência, disciplina, organização, comprometimento, velocidade, trabalho em equipe, endurance, competir sem dormir e sobreviver apenas com uma mochila nas costas. E ainda ser eficiente em vários esportes, corrida, ciclismo, orientação, canoagem e constantemente novas disciplinas como natação, patinação, rafting…
Sair da rotina, ter uma vida mais simples, fugir das cidades e da civilização, conhecer novas culturas em outros países e respeitar tanto a natureza quanto as pessoas e a si próprio, são valores que buscamos com as corridas de aventura. Achar quatro atletas dispostos a enfrentar o inesperado é um trabalho bem difícil e por isso, muitas pessoas dizem que largar já é uma vitória numa corrida de aventura. Quanto mais longa for a prova, maior é o treino, o comprometimento e a logística envolvida e existem diversos degraus a serem escalados nessa jornada.
Na minha equipe por exemplo, usamos as provas individuais de multisport e as curtinhas de aventura, com até 100km ou 10 horas, como treino. Nos fortalecemos individualmente no multisport e afinamos o trabalho em equipe nas provas curtas, pois a velocidade e a intensidade são maiores e portanto a margem para erros é menor. Mas para muitos, essas são as portas de entrada no esporte e completar essas provas já é uma grande conquista. É o primeiro contato com mapas e com a estratégia além do preparo físico numa competição.
As provas de média duração, entre 100 e 300 quilômetros ou até 40 horas, já exigem mais logística, mais treino e muita preparação pré prova, devemos pensar em quais comidas levar e preparar nossas caixas para as transições com trocas de roupa e equipamento. Também é o primeiro contato com a privação do sono (claro todos nós já varamos aquela noite na balada e engatamos na aula ou no trabalho no dia seguinte, é mais ou menos a mesma sensação!). Até 300 quilômetros dificilmente vamos parar para descansar, é uma distância limite para não dormir.
A somatória desses três tipos de provas, resulta nas corridas de caráter expedicionário que duram mais de três dias e têm percursos acima de 300 quilômetros. Esse é o grande objetivo, ou sonho, de qualquer corredor de aventura. Nas corridas de expedição juntamos a eficiência adquirida no multisport, o trabalho em equipe constante, uma super logística, já que separamos comida e equipamentos para toda a prova e além de tudo isso, entra o fator sono. Dormimos pouco, apenas 2 horas a cada 24 horas em média e estamos expostos constantemente, ao cansaço, aos elementos naturais e a relação com cada um dentro da equipe.
Os percursos nas corridas de aventura não são demarcados e a única referência para a equipe são os postos de controle, os PCs, que devemos passar em ordem ao longo do percurso. Muitas vezes esses PCs não têm ninguém, são apenas prismas com picotadores (uma bandeirinha com um grampeador que marcará com um desenho único o número do PC) e chegamos neles com uma bússola, um mapa e muita confiança no navegador do time!
O papel do navegador é crucial para o desempenho da equipe. Ele nos passa segurança, economiza nossa energia e toma decisões importantes de rotas para a equipe. O contrário disso também ocorre e pode até tirar a equipe de uma prova com um erro grave de navegação por exemplo. Mas esse integrante merece um post inteiro para seu entendimento.
O número de PCs numa prova varia muito, podemos ficar um dia inteiro sem passar por nenhum posto de controle. Em alguns desses postos fazemos a troca de modalidade, de canoagem para bike, de trekking para natação e assim por diante. Esses PCs são denominados áreas de transição, ATs, é onde teremos mais comunicação com a organização, pois esta fará o transporte de nossas caixas de um AT para outro. Mas os ATs ao contrário do que muita gente pensa, não será o melhor local para descansar, a transição de modalidade faz parte da prova, ser eficiente no AT faz o time ganhar tempo e motivação. É muito fácil perder tempo sentado, descansando nos ATs, por isso pensamos e planejamos cada passo do que fazer antes de chegar no AT gastando o mínimo tempo necessário.
Hoje em dia acompanhar as corridas de aventura pelos sites tem sido muito interessante. A organização entrega a cada time um localizador e devemos levá-lo a todo momento conosco. Esse localizador irá mostrar ao vivo onde a equipe se encontra ao longo do percurso, a escolha de sua rota, a distância entre as equipes e os espectadores vão acompanhando cada passo durante os dias. Assim como Mark Burnett revolucionou com a transmissão do Eco-Challenge a mais de dez anos (leiam no post anterior), esse sistema de rastreamento também está dando uma nova cara as provas, enquanto estamos no meio do mato. Agora falta cada equipe levar consigo uma câmera de vídeo, estilo Go Pro, e quando clicarmos no time dentro do mapa no site, também veremos ao vivo o que está acontecendo. Mas isso é só uma ideia e precisa de muita lapidação para dar certo. O importante agora, é que temos mais de 300 mil acessos ao mapa durante uma corrida e isso é uma grande conquista e um grande avanço para o esporte.
Claro, é super importante que equipes de tv filmem e produzam programas sobre as corridas de aventura, mas é praticamente impossível mostrar tudo que realmente ocorre numa prova e muitas vezes esses programas dão ênfase ao sofrimento e a dor ao invés da verdadeira essência por trás do nosso esporte. No próximo post vou falar sobre diferentes formas de absorver essa "dor" e mostrar que o desconforto existe, mas o sofrimento é opcional.