Às vezes acho que sou meio louco de largar o conforto da minha casa e ir dormir deitado no chão, com a cabeça apoiada numa pedra. Ou sair na chuva só com a roupa do corpo para passar cinco dias. Esgueirar-me dentro de uma mata tão densa que causa até claustrofobia. Muitas vezes à noite. Mas dai o feixe da lanterna ilumina o rosto dos meus companheiros de equipe e então vejo que posso até ser louco, mas não sou o único. E isso é bom porque, para eles, não preciso tentar traduzir a minha loucura em palavras. Reconheço nos seus olhos a minha felicidade refletida.
No Rio não foi diferente, exceto pela participação do francês Franck Salgues, que conheci por email. Estava confiante que a sua experiência nos ajudaria. O Lico e a Barbara são meus parceiros de equipe desde o início da equipe Oskalunga e neles confio a minha vida, como já fiz algumas vezes. Com o Monclair, que nessa prova fez apoio, é a mesma coisa. Assim, juntando a tradição com inovação, colocamos a nossa cara a tapa no Ecomotion. A tapa, galhada, espinhada, pedrada, remada e todas essas pequenas topadas inerentes ao ambiente rústico dessas corridas. Nossa estratégia foi elaborada como nas outras edições. Consistia em ser o mais veloz possível durante o maior tempo que conseguíssemos. As paradas para descansos seriam definidas pelo local onde desmaiássemos e, tão logo recobrássemos a consciência, voltaríamos a correr.
Revendo o vídeo da largada notei o transe em que entramos durante os seis dias de competição. De dentro, a prova acontece numa dimensão paralela, um universo atemporal. Na minha lembrança a prova se dividiu em duas partes: os dias de montanha, escuros e molhados e os dias de praia, quentes e à procura de jacas maduras.
Dizem que um bom corredor de aventura tem a memória curta para poder enfrentar o próximo trecho sem se lembrar do que passou. Mas lá, minha memória foi testada. Uma montanha de 600 metros fora da rota é difícil de esquecer depois que você a escalou. Fé inabalável. Mantivemos a disputa e dentro do plano, sendo o mais veloz que nossas pernas conseguiam correr. Descendo da montanha, nos viramos e vimos a nuvem negra ficando para trás. Os dias de praia estavam por vir.
Quando pedalo ou corro pelas montanhas me preencho de felicidade. Se estou só, nem sei se isso faz algum sentido. Nas corridas de aventuras compartilho esse sentimento com os meus parceiros e ai tenho a certeza de que é real, me sinto entre os meus. A corrida de aventura mudou a minha vida, há sete anos eu não só vivo disso como eu vivo para isso.
Foram praias lindas, mas como não encontramos com o nosso apoio, a comida acabou, o que fez com que corrêssemos olhando para o chão e para as árvores a procura de jacas, mangas, goiabas, bananas verdes, tudo que nossa maravilhosa floresta tropical pudesse nos oferecer e os moradores dessa floresta também.